Eu pensei... O curioso título deste ensaio é uma espécie de autobiografia. Incompleta, por certo, porquanto trate apenas de flashes de uma vida. Ou de duas vidas. Ou mais vidas...
Eu pensei que estivesse preparado. Não estava. Não estou.
Já se vão lá 32 anos de minha “conversão” ao Espiritismo, saindo do Catolicismo, em busca de respostas... Eu as encontrei – aquelas iniciais – mas vieram outras perguntas, a partir das respostas, e assim tem sido. Quanto mais respostas, mais perguntas. O que nos impele a continuar buscando.
O Espiritismo fala da Morte tanto quanto fala da Vida. Quando comecei a estuda-lo, a ideia de “única vida”, “uma só vida” se transmudou para “múltiplas existências”, em face da Reencarnação. Várias vidas... Tantas quanto sejam necessárias. Certo? Não! Uma só vida, sim, a vida imortal, a vida espiritual, que se subdivide em múltiplas encarnações e no período de aprendizado que passamos no “espaço”, no Invisível...
Quantas vezes eu falei da morte? Incontáveis... Quantas palestras, quantos seminários, quantos grupos de estudo sob minha coordenação, quantos debates... A TEORIA espírita é muito cristalina sobre o conceito de morte (física) e o retorno à Pátria Espiritual. Os laços, dizem os Espíritos, se fortalecem ainda mais, porque o Espírito guarda as relações de simpatia e afinidade cultivadas em cada uma das encarnações sucessivas.
Mas... E quando chega a morte? E quando chega a hora da dolorosa despedida? Quando se tem certeza de que aquele ou aquela que “sempre estava ali” não estará mais, sob o alcance de nossa visão material? E o momento do adeus? As últimas palavras, o corpo sendo velado, o caixão fechado, baixando à sepultura? Como lidar com isso?
Reconheço que não é fácil. Evidente que já perdi parentes e amigos. Alguns deles, muito próximos, muito fraternalmente unidos a mim. Mas a dor presente é lacerante e dolorosa. Ela invadiu, e permanece...
E por que dói? Por que machuca?
Podemos pensar que tudo o que fizemos com ela ou por ela foi insuficiente... Subjugados pela imutabilidade da morte – e por não podermos revertê-la – somos forçados a aquiescer e a nos conformarmos.
É muito difícil. Para nós, que ficamos e, com certeza, para aquela que se vai.
Os últimos e derradeiros dias, semanas, meses, foram torturantes. Uma vida que se foi, esvaindo aos poucos. As dores físicas tolhendo passos, movimentos, reações e a convivência. Dolorido, pungente, entristecido.
Para suportar, a lembrança dos bons momentos vividos, em diversas etapas, desde a infância, a adolescência, os arroubos da juventude, a idade adulta, mais equilibrada e o início da maturidade. Foram 44 anos de FELIZ CONVIVÊNCIA... De muita alegria, de muita serenidade, de muito apoio...
Uma segunda mãe, terna, atenciosa, tolerante, apoiadora de todas as resoluções. Companheira de todos os momentos, indizível a falta que começa a fazer...
Mas, ela precisou ir – ANTES. Ao cerrar os olhos, definitivamente para esta vivência, abriu outros para o Mundo Maior, onde se reencontrou com muitos amigos que haviam ido antes. Está se recuperando das mazelas físicas e está em paz, porque muito fez e muito semeou. Sem ser perfeita, a muitos consolou, auxiliou, amparou e ensinou. Durante anos a fio, coordenou trabalhos espíritas, fez palestras, atendeu necessitados, orientou mães e jovens...
Todo o bem que fez, sabemos, reverte-se em luz para si e ela está sob essa luz, nesse momento.
Quanto a nós, as feridas irão cicatrizar... Não sabemos quando, isso é certo. Por enquanto, tudo em volta traz a lembrança do que vivemos. A casa onde residiu durante longos anos – e sobretudo na parte final deste quadrante – conserva um pouco de sua energia, e a memória de muito do que foi a nossa convivência. É estranho lá chegar e não a ver, não a ouvir, não a sentir... Isto, talvez, seja o que mais machuca!
Vamos nos recuperar. A você que nos lê, e que também se encanta com a filosofia espírita e as respostas que tanto buscava, não se decepcione comigo! Não pense que vivo o espiritismo “apenas do lado de fora” ou o do “que os lábios exprimem”. Minha consciência espírita irá prevalecer e os sentimentos (de perda e de dilacerante saudade) vão se asserenar na forma da prece e da certeza do (breve) reencontro.
Agora, a prece... A prece para que ela esteja bem o mais rápido possível e que venha nos visitar, em pensamento, em sintonia, em vibração. Nosso desejo de senti-la, espiritualmente, irá animar os dias que se seguem.
Até breve, Tia Irma! Eu te amo e sempre te amarei!
(*) Para Irma Botticelli Pereira (1932-2014).
Marcelo Henrique, é espírita, escritor, palestrante, pesquisador da Doutrina Espírita a partir da codificação de Allan Kardec, participa de vários sites, chats Nacionais sobre o Espiritismo, é membro da Associação Brasileira dos Divulgadores da Doutria Espírita e integrante do MEB, e colabora com este blog.
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