Não gostaríamos de apresentar uma visão mecanicista do cérebro, principalmente por acreditar no paradigma dualista pelo qual a mente instrumentaliza o cérebro para se inserir na realidade física onde transitamos.
É necessário compreendermos porém, que o cérebro, pelos seus antecedentes evolucionistas, exibe no seu funcionamento uma determinada operacionalidade, típica de um instrumental físico.
Com isto queremos dizer que há regras ou pelo menos, podemos reconhecer certos programas básicos pêlos quais a mente põe o cérebro em funcionamento.
Podemos até reconhecer, adotando um paradigma espiritualista, que uma mente fora do contexto físico do cérebro, pode dispor de recursos ou usar de estratégias que sobrepujam toda fisiologia cerebral, mas, enquanto contida nesta “máquina” de neurônios, ela é limitada pêlos recursos que estes neurônios podem oferecer.
Estes “limites” é que vão ficar claros quando descobrirmos o texto do “manual” de operacionalidade do cérebro.
Como qualquer outro ser vivo nós somos resultado de um processo evolutivo que privilegiou para todos a sobrevivência e a adaptação. O cérebro humano apesar de dispor de uma potencialidade extraordinária para atuar no meio ambiente que nos cerca, está “engatilhado” para priorizar a sobrevivência e a adaptação da nossa espécie. Isto exige decisões às vezes apressadas para atuações rápidas, freqüentemente tidas como insensatas.
Basta nos determos no estudo do comportamento animal para percebermos que a disputa pela vida exige que um predador esteja em constante preparo para com astúcia abocanhar sua presa.
A vítima, quase sempre mais frágil, precisa por outro lado, se predispor a uma vigilância permanente para não se surpreender com as surpresas de um ataque fatal.
Dentro desta estratégia de ataque e defesa que se perpetua em todos níveis da escala evolutiva, do peixe que abocanha a libélula, da cobra que envenena o coelho ou do tigre que dilacera um bezerro, é imperioso que o cérebro predisponha toda sua estratégia para fuga, defesa ou ataque o mais rápido possível.
Quando se trata de sobrevivência não se pode perder tempo com detalhes nem distrairmos com a rotina para não se pagar com a própria vida o preço de uma distração. É preciso estarmos de sobreaviso a qualquer sinal novo e reagirmos da maneira mais acessível e rápida possível para uma fuga imediata se este sinal indicar o perigo de um ataque ameaçador.
No conjunto de informações que nosso cérebro detecta no mundo a nossa volta, a escala de prioridades estabelece que nos interessa a informação mais útil, a mais acessível, não, necessariamente, a melhor ou a mais lógica. O cérebro opta por simplificar para se adaptar e para isto nos põe diante de um esboço rápido da realidade.
O processo de sobrevivência exige que cada presa esteja sempre de prontidão para se prevenir dos ataques dos seus predadores e, de certa forma, na luta entre o mais forte e o mais fraco, somos todos presas e predadores uns dos outros. Neste sentido, o cérebro posicionou o foco da consciência na atenção imediata para todos os fatos novos que se projetam no meio ambiente. Ninguém pode ser pego de surpresa, nem se deter para análise pormenorizada de um objeto que pode ou não ser hostil, que pode ser ou não sombras da vegetação ou uma fera traiçoeira que nos ataca e mata.
O cérebro humano continua privilegiando todo este mecanismo de defesa, se adaptando a rotinas e menosprezando o que é corriqueiro para estar atento ao que é novo ficando predisposto a agir rapidamente a um perigo ou ameaça eminente. Estamos mais preparados para reagirmos à mudanças que ocorrem a nossa volta e não necessariamente ao desenrolar dos acontecimentos. Mudanças no ambiente carregam um potencial de hostilidade maior que a própria agressividade deste ambiente.
Por isto, nos habituamos aos ruídos das cidades e à monotonia do trânsito mesmo que nos sejam, de início, muito desagradáveis. Por isto também, não nos abalamos com mais uma notícia de engarrafamento nas ruas ou de um empregado que se acidentou na fábrica.
Mas, nos surpreenderíamos com a notícia de um terremoto na avenida Paulista ou de um jacaré no rio Tietê.
Os fatos novos, ao lado do perigo que podem ou não representar, tem o poder de desencadear, pelo inusitado da sua ocorrência, uma sensação agradável ou hostil, uma emoção forte que se irradia por todo nosso organismo, liberando a adrenalina para uma reação em cadeia que nos põe em estado de alerta. Por isto, no desenvolvimento do cérebro, seguindo a escala animal, percebemos que o cérebro emocional, representado pelo sistema límbico, precedeu o desenvolvimento do cérebro intelectual, expresso pelas circunvoluções cerebrais do neocortex.
É sempre mais vantajoso uma resposta emocional rápida e eficiente do que uma reação meticulosa e bem elaborada. A primeira facilita uma estratégia de fuga mais eficaz, mais ligada a sobrevivência do que a segunda que exige tempo muito precioso quando o que está em jogo é viver ou morrer.
Qualquer um de nós percebe que as emoções permeiam nossos comportamentos tanto nos gestos motores como nas interjeições do nosso psiquismo. Qualquer acontecimento que presenciamos ou qualquer objeto que contemplamos serão as emoções que redigirão o texto da nossa redação sobre o que testemunhamos ou percebemos.
O conteúdo e a linguagem que escreve este texto, tem muito pouco de pensamentos lógicos, de decisões racionais ou de interpretações verosímeis. O livro da experiência de vida de cada um de nós está escrito com a aparente desordem do caos e só tem idéias emocionais.É freqüente percebermos quantas vezes nossas atitudes foram tomadas “sem pensarmos”, quantas vezes agimos levados pelo “calor das emoções” e, ao “pensarmos melhor”, muitas vezes, mudamos nossos julgamentos e até nossas decisões.
É comum também, conhecermos pessoas racionais ou corajosas diante de problemas da vida que se emocionam ou apavoram ao verem um ferimento sangrando, ou ao subirem no elevador ou se verem nas alturas de um edifício.
O pavor que a emoção provoca é muito mais forte que a interpretação racional do possível perigo que estejam enfrentando.
Freqüentemente aparentamos muita segurança ao tomarmos decisões importantes, acreditando estarmos fazendo o melhor, estarmos agindo criteriosamente, com lógica, com juízo e sensatez.
Na verdade, escolhas de significado decisivo para nossas vidas, como a opção para determinada profissão, a casa onde vamos morar, a pessoa com quem vamos nos casar, o carro que vamos comprar ou o negócio que vamos realizar são sempre direcionados por decisões francamente emocionais.
Nossas reações emocionais nos dão uma chance melhor de sobrevivência e adaptação ao ambiente do que os processos mentais que usam a lógica, o cálculo ou as meticulosas decisões tomadas depois de raciocínios demorados e que nem sempre são agradáveis.
É por isto que nos acostumamos a fazer mudanças freqüentes de julgamentos. As emoções nos antecipam conclusões apressadas mas, de pouca precisão, por isto, freqüentemente efêmeras e sujeitas a revisões. Num jogo de futebol, numa partida de tênis ou numa corrida de cavalos podemos ir mudando, até aos instantes finais do jogo, as nossas previsões de quem será o vencedor. Por isto também, em qualquer escolha afetiva que fizermos, haverá sempre a possibilidade de se questionar o acerto da decisão.
Nossa consciência flui continuamente num fluxo incessante de múltiplas idéias. Nosso mundo interno, do ponto de vista mental não é estático, e as idéias não estão rigidamente estabelecidas. A mente tem a dinâmica de um mosaico de luzes que se projetam pela consciência que se contrai ou expande diante do que nos emociona.
Na luta pela vida, a necessidade de agirmos rápido faz com que a mente tenha uma atuação “on line”, que põe a nossa atenção e a nossa consciência sobreposta aos fatos para não ser pega de surpresa. Neste sentido, a mente tem que fazer escolha rápida de prioridades, dirigindo suas informações sensoriais no sentido de tomar decisões mais úteis e mais acessíveis e não necessariamente a melhor. Uma alternativa que está mais à mão pode nos dar uma chance de fuga ou defesa mais rápida.
Não convém perdermos tempo para analisarmos a gravidade ou a extensão do perigo. As estatísticas podem estar a nosso favor, mesmo assim é melhor salvarmos a nossa pele primeiro.
Os processos racionais de tomada de decisões são seguramente mais convenientes. Eles nos permitiriam fazer escolhas dentro de um leque de alternativas e nos poriam à frente de detalhes minuciosos que nos dariam mais competência para a escolha mais acertada. Porém, não nos garante que seria a decisão mais agradável nem a mais eficaz.
Demorar para decidir, esperando detalhes das informações disponíveis poderia custar um pedaço da perna do surfista que confundiu sua prancha com um tubarão.
É melhor uma interpretação mais rápida mesmo que, ao invés de fugirmos de um tubarão, tenhamos apenas nos assustado com a casca de uma árvore.
A mente ao iniciar sua tomada de decisões não pode se prender aos detalhes, não pode fazer análise sequenciada, precisa fazer um julgamento rápido da realidade usando para isto uma idéia interpretativa dos acontecimentos e dos objetos. Nossa consciência está adequada para fazer apreensões representativas das coisas e dos objetos. Para isto usamos nossa capacidade cerebral de fazer interpretações e reconhecimento com base em pistas sensoriais de informações. Todos sabemos de antemão que é fácil, mesmo estando de olhos fechados, reconhecermos, pelo simples tato, um objeto como uma carteira, um lápis ou um molho de chaves que é colocado em nossa mão. Um simples toque no objeto nos permite um reconhecimento imediato do objeto por inteiro. Também sabemos que nenhum de nós precisa ver todos os lados de uma xícara para reconhecê-la, nem ver um amigo em todos os seus ângulos e perfis para identificarmos quem é. Os pequenos fragmentos de informação já são suficientes para nos permitir ajuizar os objetos ou as pessoas em todas suas dimensões.
A realidade que vemos ou o mundo que percebemos com nossos sentidos é, na verdade, interpretado na nossa mente.
Cada objeto que nos atinge nos impressiona não só pelo que nos imprime nos sentidos mas, também, pelo que nos provoca na mente ao desencadear imagens e idéias. O mundo por nós vivido é essencialmente um mundo “sonhado” e “imaginado” em nossa mente.
A experiência de cada um de nós é medida pelo referencial de imagens mentais que criamos e armazenamos sobre o mundo onde vivemos.
Cada objeto, cada palavra, cada sensação é carregada de um potencial simbólico que desencadeia em nós a capacidade de criar imagens vivas da realidade.
Daí a conveniência de se estudar as palavras pela sua transmissão de idéias e compreender os objetos pelos seus significados. Dar consciência ao aprendizado é apreender as qualidades de cada coisa e de cada objeto.
A motivação, os fatos novos e o clima de emoção enriquecem o aprendizado. O cérebro aprende quando vivenciamos experiências, quando aprendemos o significado de cada coisa ou identificamos as qualidades dos objetos.
Nossa maneira de vivenciar a realidade se processa pela construção rápida de conceitos .
Aprendemos a distinguir o que é certo do que é errado, o que é bom do que é mau, o que agrada do que agride e, principalmente, o que é comestível do que é indigesto.
É melhor saber logo quais as conseqüências antes de identificar pormenorizadamente as causas. É uma questão de sobrevivência.
Nubor Orlando Facure,76, é médico, espírita, neurologista, durante anos foi diretor da Unicamp se tornando um dos primeiros a falar do Espiritismo dentro da Medicina, durante 50 anos de sua vida, foi amigo, médico e companheiro de Chico Xavier, por 41 anos esteve ao lado de Terezinha de Oliveira grande espírita da jornada como amigo e médico, é testemunha viva do verdadeiro milagre de Uberaba, como interlocutor conversou com o espírito famoso de André Luiz, possui um dos maiores conhecimentos sobre o cérebro humano, hoje ainda clinica, e é presidente do Instituto do Cérebro em Campinas SP, também é nosso amigo e colaborador a dois anos e meio, escreve mensalmente para este blog, recebe e-mails pelo lfacure@uol.com.br e no Facebook em sua conta Nubor Orlando Facure.
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