Conheço muitos
espíritas "seguros de si mesmos". Eles pertencem ao gênero "o
Espiritismo tem todas as respostas" para as múltiplas indagações da vida.
E, do alto de sua segurança "espírita", tudo interpretam com os olhos
voltados para uma “certeza” de que as mínimas situações do viver são reflexos
do passado espiritual de cada um.
Esta pseudológica serve, ao mesmo tempo, de cruz e bálsamo. Cruz, porque implica a crença de que “tudo está pré-traçado” e estamos obrigados a resgatar erros pretéritos (
Bálsamo, pois coloca a criatura como um “coitadinho”, que tem de suportar as contrariedades e iniquidades da vida pois, ao final, receberá como recompensa, uma vida melhor e mais espiritualizada.
Bom seria se a questão fosse unicamente esta, ou seja, se os efeitos
deste raciocínio (?) estivessem circunscritos ao autoexame individual, um
“olhar para dentro de si”, para entender melhor a si mesmo, o próximo e o
mundo. Todavia, não é o que ocorre. Com esta pseudológica, as pessoas se tornam
(nos Centros Espíritas e fora deles) conselheiras dos outros, analisando
rapidamente as contingências das atuais provações/expiações para “encontrar”,
com mais celeridade ainda, a “razão” ou o porquê dos sofrimentos e das
dificuldades do hoje, apresentando com naturalidade (?) a raiz, causa ou origem
daqueles.
Esta gente, francamente, não estuda a Doutrina Espírita, mesmo frequentando grupos e horários de atividades em instituições espíritas.
Ao invés de buscar, no Espiritismo, caminhos e fontes para o
entendimento maior da Vida, encontra justificativas para o seu proceder (e o
dos outros) com embasamento em respostas ou capítulos das chamadas Obras
Básicas. Fazem, então, recortes do pensamento de Kardec/Espíritos, para
explicar (?) as causas da felicidade/desgraça humanas.
Exemplo típico disso é a adesão de algumas instituições e de muitos
“pensadores” espíritas à tese da restritividade absoluta ao aborto - inclusive
sem a ressalva contida na Codificação: o risco de morte para a mãe. Querem,
eles, apertar ainda mais o freio legal, fazendo desaparecer as excludentes de
culpabilidade (aborto pós-estupro e perigo de perecimento da gestante) e o
aborto judicial, quando o magistrado pode autorizar (anencefalia, por exemplo)
a interrupção da gravidez. Essa gente se baseia em algumas exceções (o caso
recente da criança Marcela de Jesus Galante Ferreira, que viveu aparentemente
sem cérebro um ano, oito meses e doze dias). Marcela tinha o mesencéfalo, parte
intermediária do cérebro e outras estruturas que garantiram sua sobrevida,
conforme a pediatra Márcia Barcellos que a acompanhou. Mas, os espíritas (assim
como os evangélicos e os católicos) nem querem saber da lógica e da ciência.
Dizem bravatas por aí, impingindo a pais e mães o calvário de suportar uma
gravidez sem qualquer perspectiva de êxito, para obedecer aos “desígnios
divinos”.
A lógica espírita, no entanto, legítima e
verdadeira, não impõe nada a ninguém, por determinação ou impedimento. Ela nos
faz utilizar, pessoal e subjetivamente, nosso raciocínio para entender a vida e
melhor vivê-la. Longe de prescrições e apenações, como bem quereriam os
“espíritas” seguros de si mesmos.
Marcelo Henrique, é advogado, espírita, palestrante, divulgador da Doutrina espírita, e colaborador deste blog.
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