Em certa ocasião estive numa cidade do interior para fazer uma palestra sobre o cérebro e a mediunidade. Pouco antes de começar, uma senhora de uns 50 anos de idade me procurou com certa ansiedade, querendo que eu “conhecesse a sua mediunidade”. Dizia que, em certas ocasiões, se sentia, subitamente “fora do seu próprio corpo”. O fenômeno ocorria em qualquer ambiente, não precisando de nenhum “preparo” prévio. Podia estar numa reunião mediúnica ou numa roda de amigos que, de repente, percebia estar ocupando dois lugares. Sentia-se no corpo físico com o qual ela se movia e falava e, no corpo espiritual, de onde procedia seus pensamentos. Nesse estado, podia observar as pessoas presentes, percebendo nelas, inquietude ou sinais de doença em algum de seus órgãos.
O quadro que essa senhora relata, constitui o fenômeno típico do sonambulismo natural, podendo estar ela absolutamente consciente durante todo o processo de desprendimento. No Livro dos Espíritos, Allan Kardec, recebeu as instruções dos Espíritos descrevendo o sonambulismo como um fenômeno no qual a Alma está parcialmente liberta do corpo e, que nestas circunstâncias ela adquire propriedades que lhe permite ver e ouvir além dos limites que os órgãos dos sentidos nos impõem enquanto encarnados.
A palavra sonambulismo significa “andar dormindo” e, no meio espírita, precisamos tomar cuidado porque, nos dias de hoje, ela tem sido empregada quase que exclusivamente para se referir ao fenômeno do sonambulismo infantil. Esse, é um distúrbio do sono, mais freqüente em crianças dos 5 aos 12 anos e que se caracteriza justamente por ocorrer no início do sono, nas fases mais profundas do sono, em que a criança se levanta da cama e sai andando pela casa. Apesar da semelhança, esse quadro não tem nada a ver com o “sonambulismo natural” que estamos abordando.
Quando publicou o Livro dos Espíritos, em 1857, Allan Kardec disse na sua introdução que tinha se interessado pelo Sonambulismo ( desdobramento do Mesmerismo) durante 36 anos, portanto desde os seus 17 anos de idade. Nessa ocasião o sonambulismo era estudado em toda Europa despertando interesse acadêmico de inúmeros sábios da época.
O início dessa história remonta aos primeiros trabalhos de Mesmer quando introduziu suas idéias sobre o “magnetismo animal” e a provocação em seus pacientes da chamada “crise” para normalização do fluxo magnético. Durante a crise ou transe, o paciente entrava num estado torporoso e sensível no qual mantinha-se extremamente receptivo às sugestões e aos efeitos da imaginação.
Em 1819 a divulgação do sonambulismo tinha ganho uma grande importância particularmente na França. Nessa ocasião, Paris, já reconhecia a popularidade do Abade Faria, que com seus estudos, introduziu o conceito e o método da sugestão como agente produtor do sonambulismo. O seu livro, publicado nas vésperas da sua morte “Da causa do Sono Lúcido no Estudo da Natureza do Homem (1819)” acendeu a polêmica entre os que acreditavam na existência e atuação do fluido magnético proposto por Mesmer e a interferência da sugestão na produção do fenômeno sonambúlico.
O magnetismo e o sonambulismo estão intimamente ligados ao Espiritismo, tanto nos seus fundamentos históricos como na sua proximidade com os fenômenos mediúnicos. Nesse sentido é oportuno reabrirmos o Livro dos Médiuns e o Livro dos Espíritos e aprender o que Kardec fala sobre o assunto:
Livro dos Médiuns – Itens 162 e 172 :
1 - “Muitos sonâmbulos vêem perfeitamente os Espíritos e os
descrevem com tanta precisão, como os médiuns videntes. Podem confabular com eles e transmitir seus pensamentos. Nesses casos eles são sonâmbulos-médiuns”.
2 - O sonambulismo natural é espontâneo ao passo que o sonambulismo magnético é voluntário e por isso pode ser provocado. Um não suprime o outro já que, em ambos persiste a faculdade da alma em emancipar-se; ocorre apenas uma outra diretriz, que disciplina o fenômeno. A educação mediúnica também permite ao médium que, pela sua vontade, ele tenha controle voluntário sobre o Espírito que vai por ele se manifestar.
3- Pode considerar-se o sonambulismo como sendo uma variedade da faculdade mediúnica.
4- O sonâmbulo age sob a influência do seu próprio Espírito, é sua alma que, nos momentos de emancipação, vê, ouve e percebe, fora dos limites dos sentidos. O médium ao contrário, é instrumento de uma inteligência estranha; é passivo e o que diz não vem de si. O sonâmbulo exprime o seu próprio pensamento, enquanto o médium exprime o de outrem.
Livro dos Espíritos – Pergunta 425
5- O sonambulismo natural é um estado de independência do Espírito, mais completo que no sonho, estado em que maior amplitude adquirem suas faculdades. No sonambulismo, o Espírito está na posse plena de si mesmo e seu corpo acha-se de certa forma em estado de catalepsia, deixando de receber as impressões exteriores.
Percebe-se claramente que sonambulismo e mediunidade caminham juntos e, nos dois fenômenos encontramos a Alma, emancipada e livre para se manifestar.
Nubor Orlando Facure, 77, é médico, espírita, escritor, palestrante, divulgador da Doutrina Espírita, durante 50 anos viveu ao lado de Chico Xavier como amigo e médico, esteve dentro de casos famosos do Espiritismo no Brasil, um dos maiores estudiosos do cérebro humano, Nubor é hoje presidente do Instituto do Cérebro em Campinas, foi o primeiro médico na Unicamp a falar do Espiritismo como fato, é colaborador deste blog e recebe e-mails pelo:
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