terça-feira, 7 de junho de 2022

DEVO IR OU DEVO FICAR - POR MARCELO HENRIQUE


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Should I stay or should I go now?
Should I stay or should I go now?
If I go there will be trouble
And if I stay it will be double



Devo ficar ou devo ir agora?
Devo ficar ou devo ir agora?
Se eu for, terei problemas
E se eu ficar, terei o dobro

(The Clash, “Should I stay or should I go”).

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A canção – que tocou muito! – ecoa nos meus ouvidos. E, creio, nos seus, também. Há um “toque shakespeariano” no título e no período que se repete na letra da música: “Ser ou não ser, eis a questão” (Hamlet, Ato III, Cena I). E, utilizando uma metáfora que gosto muito, desde que me tornei, em 1981, espírita, são as diversas “encruzilhadas” da(s) nossa(s) vida(s)...



Então, meus amigos: - Devo ficar ou devo ir agora? Qual será a minha (ou a sua) decisão, diante das situações da presente encarnação?



Não... Se você esperava que eu dissesse isso, eu vou desdizer: não há roteiros, mapas, bulas, esquetes, determinismos ou programações pré-estabelecidas. No cenário existencial, o ator principal (você!) é quem decide quais caminhos trilhar. E, neste ponto, se vai agir ou não, se vai ficar ou ir...



Foi assim com Jesse Koz e seu cão golden retriever, Shurastey (o som da palavra inglesa, logicamente), que viajavam pelo mundo a bordo do Dodongo, um fusca 1.300, 1978, com placas da cidade catarinense de Balneário Camboriú. Aos 29 anos, Jesse nos deixou esta semana (dia 24 de maio), junto com Shurastey e Dodongo, num grave acidente automobilístico, próximo à cidade de Selma, no Estado do Oregon, nos Estados Unidos. A dupla – ou o trio, considerando o simpático veículo em que viajavam – estava próxima do tão desejado destino, o Alaska. Triste!



Foi um pouco antes, mais particularmente em 2017, que este jovem catarina decidiu abandonar seu emprego de vendedor em um shopping center, se desfez do pouco que tinha e iniciou uma jornada de viagens, mundo afora...



Jesse não quis ficar. E foi... Foi até onde seus sonhos permitiram ir. E foi muito feliz, junto com o especial companheiro. Como escreveu seu amigo Fabrício Oliveira, no Instagram, “Espalharam alegria, amor e mostraram a importância da amizade para o mundo”.



Alegria. Amor. Amizade. Três palavras com a letra “A”, dos inícios e dos reinícios. Onde tudo começa... O quanto de alegria, amor e amizade você tem, todos os dias? Não falo de um oásis de perfeição, onde tudo pareceria fluir com naturalidade, leveza e completude. Não! A vida (real) não é assim, sabemos... Ela é uma gangorra, com altos e baixos, ou uma montanha-russa, em que subimos ou descemos, com velocidades variáveis, experimentando os caminhos da vida. Caminhos, estes, que escolhemos, invariavelmente.



Há sabores, doces ou amargos, sabemos, nesta trajetória. Podem ser pequenos espasmos de alegria entre várias situações de dificuldade, eu bem sei. E há quem diga que os instantes alegres são muito rápidos e que os períodos de tristeza sejam maiores. Talvez seja uma “ilusão de ótica”. Ou uma forma – particular, em função do que somos espiritualmente, e da visão precária que a condição de “estar na carne” nos possibilita, diante do universo (e da realidade) espiritual. A sabedoria, que é a exata noção do que realmente existe e se passa conosco, no entanto, só virá lá na frente, após muitas “léguas” percorridas.



Por enquanto, nos cabe trabalhar por sermos mais alegres, amorosos e amigos. O quanto pudermos. Assim como Jesse e Shurastey (que foto linda, meu Deus!). Você que tem (ou já teve) um animalzinho de estimação sabe disso, vive isso, lembra-se das situações... Os sentimentos que nutrimos pelos animais me parece – e isso desde antes de eu me tornar espírita – um estágio para realmente aprendermos o que é o tal amor incondicional (se é que este existe)...



Falemos, então, um pouco mais dos animais. Mesmo que você não seja espírita, quero aproveitar este momento e este ensaio para me dirigir àqueles que mantêm algum relacionamento, durante a vida, com nossos “irmãos menores”, especialmente aqueles que podemos chamar de animais domésticos.



Os animais AINDA não são Espíritos, como nós. Um dia, o serão... A Lei do Progresso, inexorável, exercerá sobre eles – assim como para conosco – a sua eficácia e aplicabilidade. E eles seguirão seu percurso, tornando-se, também, melhores até o instante em que, não sabemos como, seus princípios espirituais tornar-se-ão Espíritos.



Os animais têm alma? Sim! Que preexiste e sobrexiste à morte física. Um princípio que sobrevive ao corpo, mas uma alma inferior à dos homens, havendo “entre a alma dos animais e a do homem, tanta distância quanto entre a alma do homem e Deus” (item 597, “a”, de “O livro dos Espíritos”. Ainda não é dotada da faculdade que caracteriza a espécie humana, o livre-arbítrio e, quando da morte, ficam numa espécie de estado errante (a que chamamos, nós, espíritas de Erraticidade), aguardando nova oportunidade vivencial (encarnação). Possuem uma espécie de inteligência, ainda que limitada às ações da vida material, uma vez que “nos homens, a inteligência produz a vida moral” (item 604, da mesma obra).



Então, é de se perguntar: o que ocorre com a “alma” dos animais, após a morte? Esta parece ser a questão de maior interesse daqueles que têm (ou tiveram) seus amigos de patas, os animais. Na pergunta 600, da obra em comento, os Instrutores Invisíveis, por meio dos médiuns, assim responderam: “O Espírito do animal é classificado, após a morte, pelos Espíritos incumbidos disso e utilizado quase imediatamente; não dispõe de tempo para se pôr em relação com outras criaturas” (nossos os grifos).



Então, meu amigo, o Shurastey logo, logo estará, novamente, em solo terreno, provavelmente animando o corpo de outro cão, para seguir a sua trajetória ascendente. E será, novamente, tão feliz quanto foi ao lado do Jesse, assim esperamos. E o Jesse? Irá, ao se tornar novamente consciente, após o “baque” do acidente que o vitimou, fará o “balanço” de sua existência finda, para projetar uma nova encarnação para seus aprendizados. E será tão ou mais feliz, o quanto possível, como nós, em suas andanças futuras. Quando? Não o sabemos, já que o retorno obedece às Leis Espirituais e não tem o caráter de instantaneidade (celeridade) como se dá com o “Espírito” dos nossos irmãos menores, os animais.



Daí você pode se perguntar sobre as “visões” espirituais e os “relatos” de inteligências desencarnadas, em obras mediúnicas, sobre a “presença” de animais no “mundo espiritual”. Não é mesmo? Pois é...



Iniciemos pelos nossos sonhos, noturnos, em que “nos parece” ser real a nossa “estada” com aquele cãozinho ou gatinho que esteve conosco durante vários anos. E nós o chamamos pelo nome, e ele nos atende! E aqueles momentos, durante o sono, em que voltamos a brincar com ele e sentimos, tão proximamente, a sua presença, o que é? Não raro um misto de fantasia e recordação. Um desejo imenso de estar novamente – inclusive, aí, tanto com animais quanto com pessoas que já se foram – assim com a lembrança boa daqueles instantes mágicos de alegria e contentamento, quando de nossa convivência física com o bichinho. Mas, não será real, ainda que a “nebulosidade” de nossa visão e a “precariedade” das nossas percepções possa sugerir.



Quanto aos relatos mediúnicos, inclusive os constantes em algumas obras “consagradas” pela “opinião popular”, o Espiritismo nos fornece duas explicações bem plausíveis. A primeira, está relacionada com a visão acerca da realidade pós-morte, que não é percebida de forma real e uníssona por todos os desencarnados, dadas as diferenças evolutivas entre uns e outros. “Nem sempre o que parece, é”, diz o adágio popular. Nossas visões podem estar comprometidas pelos nossos desejos e vontades, assim como, é muito comum que, para os “mortos” o que ocorra é a continuidade das situações e relações da existência física, quando os desencarnados permanecem vinculados, pelo pensamento, aos locais em que viveram (casa, trabalho, residência de amigos e parentes, locais de lazer e preferência, etc.). Vivem, assim, um “mundo paralelo”, como se ainda estivessem participando das circunstâncias comuns da vida física, que encerraram, com a morte.



Um outro ponto interessante e peculiar é o fato de que os Espíritos podem tomar a forma do que desejarem. Podem escolher a “imagem” que desejam para se tornar próximos, conhecidos e afetivamente relevantes para os encarnados (e, até, para os desencarnados, desde que estes não tenham, ainda, recuperado todas as suas faculdades espirituais, em razão daquilo que os Espíritos Superiores definiram como a “perturbação da morte”, ou após a desencarnação). E é por isso, então, que muitos Espíritos, em seus relatos, julgam ter reconhecido seus animais de estimação e tido alguns momentos de “reencontro” com eles, naquilo que chamam, equivocadamente, como “Plano Espiritual”.



Não raro, para nós que estamos nesta condição errante, o “mundo espiritual” continua sendo o mesmo plano existencial – no caso, a Terra e seus “ambientes” – já que aqui se encontram nossos afetos e interesses. E é por isso, também, que as Inteligências Superiores afirmaram que os laços de família (ou afetividade) não se destroem, mas se mantêm e se fortalecem, assim como os interesses da maioria dos desencarnados continuam sendo os “temas da vida material”.



Se você se interessa pelo tema, recomendamos as questões 592 a 610, de “O livro dos Espíritos”, em que, a partir de interessantes e inteligentes questões, as Inteligências Invisíveis nos falaram vários aspectos da alma animal e de sua trajetória, na matéria e fora dela. Recomendo!



Por fim, voltando às relações que construímos, uns com os outros e, de maneira bem particular, com os animais, Jesse e Shurastey estão em “bom lugar”, qual seja o de estada provisória. Shurastey, logo, logo, estará de volta à mãe Gaia, a Terra, para ser, certamente, motivo de alegria e afeto, com seus novos “donos”, provavelmente encenando uma “nova história de amor” para ser contada e recontada. Jesse, adiante, também regressará a este mundo de expiações e provas, com as experiências somadas de suas existências anteriores, para fazer melhor, em uma nova oportunidade.



A nós, resta a saudade. Lembraremos de cenas, de fotos, de termos acompanhado algumas “peripécias” da dupla e seu fusquinha, em lições de Alegria, Amor e Amizade. Espero, enfim, que a sua vida seja repleta, como a minha, de momentos alegres, amorosos e de vivência entre amigos. Isto nos conforta, nos infunde coragem e nos motiva a continuar lutando...





Até breve, Jesse (@jessekoz) e Shurastey (@shurastey_)!



Marcelo Henrique, é advogado, espírita, escritor, um dos grandes divulgadores da doutrina espírita, este texto foi solicitado ao autor, pela sua sensibilidade, em uma história que certamente vem de outros tempos, entre dois amigos, que escolheram viajar pelos EUA, em busca de histórias e aventuras, que daqui partiram juntos, cedo, mas, juntos.
O texto capta, com exatidão o que todos sentimos, sejamos ou não de Santa Catarina, ao conhecer a história de Jesse & Shurastey, e nos faz refletir, sobre tantas coisas na vida nossa do dia á dia.


 

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